Foto: Mamãe coruja e corujinha. Maio/2010
Se tem uma palavra que eu devo admitir que embrulha meu estômago, tinge os meus olhos de um intenso vermelho e inunda meu coração de lágrimas é a tormentosa palavra "raro", dita por um médico, claro.
Fosse um artista se referindo a uma obra, maravilha. Fosse um jornalista comentando um furo de reportagem, sucesso. Fosse uma crítica de cinema a respeito de um filme recém lançado, enfrentaria fila brincando. Mas médico olhando pra mim e me explicando que minha filha tem um raro problema, é de torturar a alma com requinte.
Ouvi a primeira vez quando tive minha primeira filha, Isadora, que viveu por apenas 2 dias dentro de uma UTI, prematura de 26 semanas, com diagnóstico grave por conta da prematuridade: doença da membrana hialina. De brinde, veio uma explicação do raro problema que piorava tudo: uma infecção neonatal.
Levei meses e meses pra entender aquele tornado que passara por mim do dia do nascimento ao óbito da minha filha. Ainda nocauteada, tive que me despedir dela antes que a oportunidade desaparecesse diante de mim. E assim, sem vida, despedi-me da pequena enferma em meus braços, cantarolando em mente (porque a dor assaltara minha voz à queima-roupa) uma música que repeti centenas de vezes enquanto a acariei dentro de minha barriga: "Leve na lembrança, a singela melodia que eu fiz...pra ti...ó bem amada...".Certamente ela me ouviu...
Achei que já tinha conhecido raridade mais que rara quando vivi o luto da pequena Isadora. Engano meu...
Antes que a Marina viesse aos meus braços, em maio de 2010 começava uma nova, inesperada e fatigante pesquisa por um raro diagnóstico, já que ela nascera com suspeita de malformação nos olhos e outras coisas associadas que nem vale a pena lembrar detalhes.
Mas explico, e não é difícil de entender. A Marina tinha alguma coisa errada nos olhos, o que só ficou desvendado após o teste do olhinho, mais exames complementares para afastar outras malformações.
Além disso, por dias e dias ela permaneceu muito molinha (hipotônica), o que conduzia a um possível sintoma dentro do quebra-cabeças de impressões diagnósticas. E para piorar, todas as causas comuns para a catarata ou glaucoma (suspeita inicial), foram descartadas.
Sobrava pensar em uma desordem genética que afetasse principalmente os olhos e, colateralmente, o sistema nervoso central e o tônus muscular.
Evidentemente eu quis sair correndo e gritando de dentro da UTI em DI-VER-SAS oportunidades, nos mais variados graus de histeria, mas não dava pra fugir dali. Minha filha precisava de mim, eu precisava ser forte, e minha dor que se virasse pra lá, que a hora era de pensar e determinar estratégias para vencer aquela etapa de indefinições.
Em 50 dias de internação da Marina, corremos atrás de consultoria em oftalmologia, em genética, em neurologia... Fizemos dezenas de exames, inclusive genéticos, mas nada além da catarata nos dois olhos foi possível assegurar como definitivo.
As principais suspeitas se foram como o vento. Os principais exames de encéfalo e órgãos internos foram todos normais. Exames genéticos, idem. Então só restava sair do hospital para cuidar dos olhos da pequena e da difculdade de deglutir que ela tinha desde a primeira tentativa de mamar.
Foi assim, aliviada e exausta, que em 29 de junho de 2010 saí com Marina e meu marido da UTI Neonatal, após 50 dias de altos e baixos emocionais ao lado de nossa amada Marina.
Mas, como bem sabíamos, a maratona estava só começando...